A desejosa

desejo

Desejou tanto, que sua vida era só desejo, aquele mesmo, único e intransferível, e acrescento, irrealizável, pelo menos para ela. Do que resultou uma vida maldita, com oscilações de esperança e frustrações. Ela não se permitia imaginar que seu desejo era impossível de se concretizar, por isso sofreu na vida. Agarrou-se ano nada. Sonhou durante a vida toda em ser quem jamais seria, ter o que não teria, tudo porque ouviu alguém dizer que é preciso sonhar alto. Assim o fez e não teve tempo de viver.

Danielle Arantes Giannini

Banco de personagens: O Inspetor do Museu

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Conheci um senhor na cadeira de espera dos Correios, muito conversador, simpático, aparentando nenhuma idade específica; parecia um rosto conservado. Estava demorando para chamarem a senha dele, e a minha também, por isso o homem pôs-se a falar comigo sem enfado ou embaraço. Não perguntou da meteorologia, como é de praxe entre desconhecidos que desejam matar o tempo ou preencher um vazio constrangedor. Ele foi logo perguntando se eu conhecia o “museu sei lá das quantas”. Não guardei o nome do museu mais por um lapso auditivo do que por desinteresse. Respondi que não. O meu novo amigo de espera não se conteve. Apresentou-se como Inspetor do Museu! Fiquei pensativo na hora, não sabia bem se havia inspetores em museus, porém não ousei fazer questionamentos porque um inspetor devia ser uma figura de respeito. Creio que se intitulava assim porque a palavra carregava algo de importância. E era, conforme ele próprio me contou. Das tantas a tantas horas da noite, era ele quem vigiava centenas e centenas de obras de sabe-se lá que valor que residiam ali no salão do acervo, todas obras valiosas, segundo o Inspetor, esperando a vez de serem escolhidas por algum curador para estrelarem uma exposição. Provavelmente era o segurança, pensei eu, mas não estava disposto a insistir nos esclarecimentos porque o homem se bastava de tanto orgulho de seu trabalho. Talvez fosse uma atividade carregada de tédio e dores nas pernas, só que o “inspetor” via uma relevância tão contagiante naquele afazer diário, que eu também fui contagiado pela aura imponente da criatura sentada ali no banco de espera da agência. Saí de lá, quase hora depois, de coluna ereta, cabeça erguida, certo de que ganhara meu dia, conversando com uma criatura de tamanha importância.

Danielle Arantes G.